O chefe da diplomacia portuguesa, igualmente perito dos peritos em tudo e no seu contrário, Augusto Santos Silva, defendeu hoje na ONU o trabalho que Angola tem feito pela paz em vários países africanos, num encontro sobre Prevenção e Resolução de Conflitos na Região dos Grandes Lagos.
Por Orlando Castro
Sim, é verdade. Este é o mesmo ministro que, quando dirigia a pasta dos Assuntos Parlamentares, acusou no dia 7 de Março de 2008, em Chaves, os manifestantes (professores) que por lá se encontravam de estarem a levar a cabo uma intimidação anti-democrática e atribuiu o combate pela liberdade apenas a “históricos” do PS. O ministro acusou ainda os manifestantes de “nem sequer saberem distinguir entre Salazar e os democratas” e de nem terem “lutado contra o fascismo”.
“A liberdade é algo que o País deve a Mário Soares, a Salgado Zenha, a Manuel Alegre… Não deve a Álvaro Cunhal nem a Mário Nogueira”, afirmou então Santos Silva, acrescentando que estes “lutaram por ela antes do 25 de Abril contra o fascismo, e lutaram por ela depois do 25 de Abril contra a tentativa de tentar criar em Portugal uma ditadura comunista”.
“O clima político que algumas pessoas estão a tentar desenvolver em Portugal é um clima de intimidação, é um clima próprio da natureza anti-democrática dessas forças. E se for preciso defender outra vez, como defendemos em 75, a liberdade em Portugal, o Partido Socialista, posso garantir, estará na linha da frente da defesa das liberdades públicas”, afirmou, na ocasião.
Reagindo a estas declarações, o famosíssimo (pelas piores razões) deputado social-democrata Miguel Relvas manifestou-se “chocado” com as declarações do ministro dos Assuntos Parlamentares. “Há já algum tempo que o ministro passou a fronteira do bom-senso e com total impunidade”, sustentou o social-democrata, afirmando que o responsável pela pasta dos Assuntos Parlamentares tem evidenciado um “comportamento de guerrilha e hostilidade”.
“O senhor ministro tem que perceber que a barricada da liberdade, desta vez, não está do lado do PS, mas do lado dos professores e não tem que ficar indignado que estes se manifestem e reclamem os seus direitos”, afirmou Miguel Relvas.
Bem dizia Emídio Rangel
Este episódio demonstra, mais uma vez, que o governo português está-se nas tintas para todo, neste caso para os angolanos. Diferente é a posição relativamente aos senhores feudais que dominam Angola.
Por alguma razão, Emídio Rangel disse (Janeiro de 2008) sobre Augusto Santos Silva: “(…) Não tenho o mínimo de consideração nem de respeito intelectual pelo saloio que detém no Governo a pasta da Comunicação Social e com quem mantenho, há anos, dissidências agravadas. Pelas baboseiras e falta de rigor que punha nas crónicas do ‘Público’, pela arrogância e pesporrência que exibia quando era ministro da Educação e logo a seguir da Cultura, sem ter feito nada, mesmo nada, nem pela educação nem pela cultura, porque o considero um dos ministros mais incompetentes do Governo de José Sócrates, tendo falhado de forma grotesca todas as decisões que tomou no âmbito da Comunicação Social, como sempre referenciei nas crónicas que escrevi ao longo do mandato do actual primeiro-ministro”.
Mas voltemos à fase actual deste ministro, igualmente arrogante e pesporrente. Disse ele que queria “louvar todo o trabalho que Angola tem feito na presidência da Conferência Internacional para a Região dos Grandes Lagos, na procura de soluções para conflitos e na identificação de caminhos de desenvolvimento da região”.
Com o título “Paz e Segurança Internacional: Prevenção e Resolução de Conflitos na Região dos Grandes Lagos”, este debate aberto do Conselho de Segurança foi presidido por Angola. Santos Silva foi convidado a participar pelo seu homónimo angolano, Georges Chikoti.
No seu discurso, Santos Silva disse que “África ocupa um lugar especial na política externa portuguesa.”
Enquadrando a actuação do país no âmbito da ONU, da União Europeia e da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, o ministro disse que continua “constante o empenho de Portugal no multilateralismo activo.”
Santos Silva falou dos casos específicos do Burundi, República Democrática do Congo e Sudão do Sul.
O ministro disse que a colaboração entre Comunidade da África Oriental, União Africana e ONU no Burundi “é o único caminho válido para evitar uma escalada do conflito e uma maior deterioração da situação dos Direitos Humanos no país”.
Quanto à República Democrática do Congo, considerou “fundamental assegurar um forte apoio à missão da ONU no terreno, MONUSCO, e promover o estreitamento da sua colaboração com as Forças Armadas” do país.
Finalmente, em relação ao Sudão do Sul, o representante disse que “as constantes violações do acordo de cessar-fogo e a dramática situação dos Direitos Humanos” preocupam o governo português “seriamente”.
Depois de se referir aos desafios enfrentados por esta região, o ministro disse que “existe também um vastíssimo potencial de desenvolvimento”, associado à presença de “uma boa governação” e à “existência de instituições sólidas”.
“Estou ciente de que a generalização da cultura democrática requer estabilidade. Não me refiro, porém, a uma estabilidade democrática a qualquer preço, mas à estabilidade que resulta do rigor no cumprimento da ordem constitucional, do Estado de Direito, da transparência e fiabilidade dos processos eleitorais e de instituições estatais que protejam os interesses de toda a população”, concluiu.
Corrupção? O que é isso?
Santos Silva é, reconheça-se, um ministro para todos os serviços. Daí que se limite, como um bom exemplar dos coloniais sipaios, a só dizer o que os seus patrões mandam. Foi por isso que, por exemplo, se esqueceu de referir que Angola é o 6º país mais corrupto do mundo, sendo que o 1º é a Somália, o 2º a Coreia do Norte, o 3º o Afeganistão, o 4º Sudão, o 5º Sudão do Sul, o 7º a líbia, o 8º o Iraque, o 9º a Venezuela e o 10º a Guiné-Bissau.
Importa, contudo, reconhecer os méritos de Augusto Santos Silva. É um ministro que sabe de tudo, que fala de tudo, que conhece tudo, que sabe mais do que todos os outros, quer fale como cidadão, quer opine enquanto ministro. É uma espécie de João Pinto, o deputado do MPLA que também se assume como perito dos peritos.
Todos sabemos que é preciso dar de comer aos filhos e pagar as prestações da cubata, mas vamos lá a ter calma e, já agora, alguma coerência.
Que Augusto Santos Silva nos passe um atestado de menoridade e assuma que, ao contrário do comum dos mortais, é catedrático em tudo, seja na comunicação social, na educação, na cultura, na economia, nas finanças, no desporto, na defesa, nas relações internacionais, nos negócios estrangeiros… é lá com ele e com quem o sustenta.
“A direita falha em critérios essenciais na resposta à actual crise, começando logo por falhar no requisito da iniciativa”, sustentava o maior (a seguir a José Sócrates) perito de Portugal, considerando que a oposição não assumia uma defesa do princípio da “equidade social”.
Será com certeza por isso que, como acontece em Angola, os poucos que têm milhões mais milhões continuam a ter, e que os milhões que têm pouco ou nada… ainda têm menos, se é que isso é possível.
Não há muito tempo, quando Santos Sila se virava para a esquerda batia forte em todos quantos lá estavam. Assumia-se como o único dono da verdade. Em relação ao PCP (hoje apoiante do seu governo) atirava a matar, tal como fazia com o Bloco de Esquerda.
“Estão cegos por preconceitos ideológicos que os impediram de perceber o quanto foi essencial estabilizar o sistema financeiro para responder à crise”, disse em tempos, entre outras sábias alusões, Augusto Santos Silva. Bons só mesmo os socialistas. Nem todos, mas sobretudo os que, por terem coluna vertebral amovível, veneram o líder. Todos os outros são uma escumalha que não merece sequer ser considerada como portuguesa.
É como por cá. Bons só mesmo os do MPLA.